31 agosto, 2006

Sentidos


O Recife cheira a suor, que escorre nos rostos de baixo do sol quente, que ensopa as camisas dos trabalhadores. Cheira a esgoto nos becos, a cana em botecos, a comida caseira nas esquinas e a laranja cravo em tabuleiros.

Recife tem cheiro de terra molhada e mato verde. Cheiro de castanha, de palmeira, de pinhão e jaqueira.

Recife cheira a escape, chourume, pneu e lixo queimado. Sufoca com fumaça de automóvel e alivia com a de nebulizador. Cheira a melancia e sal em Boa Viagem, a peixe em Brasília Teimosa e a lama na Rua da Aurora.

Recife cheira a arruda e flor do campo, a óleo na bênção de São Félix, a caldo de cana no Mercado de São José. É feito de igrejas e pontes, de todas as cores, levando a qualquer lugar, a algum recanto de Deus.

Minha cidade tem cheiro de cocada, galeto na brasa e churrasquinho, de abacaxi na praia, milho e amendoim. Tem tambores de maracatu ensaiando para o carnaval e grito de “é um real” e “ingresso sobrando eu compro”.

Recife é pipoca na porta do São Luiz, é cerveja no Marco Zero, é papo cabeça no Cine PE e música boa no Seis e Meia.

Recife é escolha: Cabeleireiro ou barbeiro. Mac Donalds ou Mercado da Encruzilhada. Boi Preto ou Seu Vidal. É prédio alto e morro mais alto ainda. Vida boa em Casa Forte, e ainda melhor em Casa Amarela.

Recife tem cheiro de cola de sapateiro nas mãos dos pivetes. Aceno de “não” a cada sinal, vidro fechado, ar ligado, tensão nas ruas, ultrapassar sinal vermelho. É medo e vontade de fugir. Mas também é lindo.

No sorriso banguelo das crianças, na garra do povo, no passo paciente dos velhos. É lindo no céu azul limpinho, na fé em ganhar no Pernambuco da Sorte, nas sacolas de feiras lotadas de frutas, no jogo de cintura dos ambulantes, na emoção do Arruda lotado.

Recife é tudo que vejo, tudo que sou, a cor da minha pele. Aquilo que me faz mais feliz, mais forte, mais apaixonada. É o lugar onde quero acordar a cada manhã, e talvez, pra sempre.

28 agosto, 2006

Nova estação


Meu aniversário
Algumas caipiroscas
Grandes amigos
Burburinho

Música alta (bem alta)
Saudade de Tê e Lu, de Mabi e Bá
Ausência de Al
Gabi presente
Sem ele
Sem vontade alguma de ter ele (oba!)

Amassada de tantos abraços
Taça esborrando de bons desejos
Boas energias
Bons olhares

Eu, completa
Inteira
Madura
Segura
Feliz
Plena de esperanças
Levemente tonta
Absurdamente serena

Bolo recebido de presente
Pedido de paz às velinhas
Cobertura de chocolate
Lambida de dedo
Muitos encontros
Conversa fiada
Tranqüilidade
Certeza:
Será massa ter 28 anos!

23 agosto, 2006

Frase do dia


Vamos beber...
Vamos sambar...
Vamos fazer a vida andar...

18 agosto, 2006

Achado


Passeando em Porto, entre sorvetes e surfistas, ela chamou minha atenção. Ao longo do dia, já havia me encantado com vestidos, biquínis, barrigas morenas, olhares curiosos e com uma rede cor-de-laranja que ficaria fantástica em meu novo quarto, mas, a princípio, confesso, não a percebi.

Fazia tempo que não ia até lá. As ruas agora são exclusivas para os pedestres. Os carros não têm mais vez, estacionam pelas redondezas. Construíram várias pracinhas charmosas dividindo e colorindo a passagem, pintaram e reformaram todas as casas – até as mais simples. A cidade, mais do que nunca, parece ter sido feita para encantar e deixar a todos com saudade na hora de partir.

Fiz aquele mesmo caminho dezenas de vezes por diversas razões, ao longo de minha vida: paquerar, namorar, jantar, tomar sorvete, comprar artesanato, chegar à praia, beber Carreteiro, curtir a um show. Mas nunca a havia visto ali, bem no meio do caminho. Na verdade, nem sei se ela existia. Pelo tamanho e a pintura recente, talvez seja mesmo mais uma das novidades do lugar.

Estava aberta. E como sentia meu coração fechado, as portas escancaradas me pareceram um convite a uma visita. Lá fui. Entrei com o pé direito, pedi licença e me emocionei com tanta simplicidade. “Os simples de coração são queridos por Deus”, diz sempre um amigo meu. Ao centro, uma cruz, um altar modesto e uma imagem da Virgem de Fátima abençoando o espaço pouco maior do que ela.

Como deve ser, fiz os tradicionais três pedidos concedidos a todos que entram pela primeira vez em uma igreja. Certamente, naquele silêncio, um anjo de passagem deve ter me ouvido. Em tempos de mentira, Porto foi um presente de Verdade na minha vida. Deixou a certeza de que não estou sozinha e que ainda há muitos caminhos coloridos a percorrer.

Ah, os pedidos! Esses eu não conto. São segredos entre mim e o céu.

17 agosto, 2006

Por hoje

Sou músicas
Retratos
Vestidos

Borboletas e
Flores.

Sou cores:
Rosa sempre
Laranja às vezes
Tricolor há pouco tempo.
Sandália havaiana,
Salto alto
Baque na rua.

Sou romance
Observação
Abraço
Carinho nos cabelos
Conversa fiada
Papo cabeça.

Sou poesia
Caminhada na praia
Medo de bola e de tubarão
Garrafa d’água
Aula de Português
Aula de percussão.

Sou janela quebrada.
Chocolate alemão
Vinho tinto
Caminho sem destino
Olhar ao longe
Óculos escuros.

Sou espera
Perdão
Angústia
Decepção.

Sou desejo que o tempo leve
Que a vida cure
Que a alma limpe
Os olhos sequem
O sorriso surja
E a chuva passe.

16 agosto, 2006

Desafinada

Quero fazer um samba alegre
Um batuque em clima de domingo de sol
Mas meu pandeiro não vibra
O tambor está rouco
Violão, não tenho quem toque
E no lugar da cuíca,
Quem chora sou eu.

Quero fazer um samba alegre
Mas só faço lamentos.


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"Silêncio, por favor, enquanto esqueço um pouco a dor no peito"

Entre homens e fadas


Meus amigos são feitos de uma matéria especial: algo entre os homens e as fadas. Têm uma varinha mágica nas mãos e o poder de transformar solidão em companhia. Eles não aparecem sempre que espero, mas nunca faltam quando preciso. E, quando chegam, renovam minhas forças, ouvem meus lamentos, não criticam meus erros, mostram-me outros caminhos e levam-me com cuidado a um lugar seguro, como se a simples presença deles pudesse me proteger de todos os males. Foi assim esse fim de semana que, de fadado à dor, transformou-se em alegria.

Cerveja preta e conversa mole varando a noite. E o novo dia começa na estrada, rumo ao mar. Sol morno, boa música, novos e velhos amigos contando histórias e fazendo sorrir. Praia. Paisagem. Paz.


Mais conversa mole e cerveja preta até chegar o pôr-do-sol em ritmo de bolero. Mãos dadas. Cheiro na flor do pescoço. Surpresa. Noite feliz. Talvez precoce. Talvez precisa. Sem pretensões, como deveria ser tudo na vida.

O sol que nasce vem dar um outro bom dia, rumo a outros mares. Mais estrada, os mesmos amigos. Mergulho em águas novas e limpas. Vento no rosto. Brincar tal crianças e peixes. Soltar os cabelos. Respirar a brisa. Dormir exausta e muito feliz.

A vida acaba de recomeçar (de novo).

À Talita, a fada do fim de semana.

08 agosto, 2006

Rumo certo


De volta ao colo
De volta ao carinho
De volta ao abraço que sempre foi meu
No mesmo sorriso
Com a mesma alegria
Como se o tempo não passasse
E o amor parasse o futuro
Pra se eternizar em nós
Todo dia.

Encontro

Recife, 3 de agosto de 2006

Te tive sob minhas lentes
ao acordar, gargalhar
caindo em pranto
fazendo charme.
Tantas, tantas vezes
despenteado, barbado, safado
desprotegido, cansado, molhado
Mil olhares, incontáveis momentos.
Em cada encontro,
a alegria de me saber em você.
Em cada olhar,
teu amor de volta.
E talvez seja assim pra sempre.
Ao menos até hoje nada mudou.

01 agosto, 2006

A vida é um pneu furado



Como todos sabem: capotei!

Não foi só naquela noite na estrada, por causa de uma “tartaruguinha” furadora de pneus. Capotei minhas férias inteiras! A cada dia, a cada instante.

Um mês inteiro me debatendo contra a vida, sacudindo o corpo, desorientada, com a vista turva - porque o óculos voou longe no primeiro sacolejo. Com os pés descalços, sem saber onde guardar a bagagem, nem onde me abrigar pra seguir a viagem.

Primeiro, ouvi aquele som estranho, sinal de que alguma coisa não está indo bem. Depois, foi tudo muito rápido, só vi o mundo todo girando e a sensação de não haver mais nada que eu pudesse fazer para mudar meu destino ou pelo menos o final daquele acidente de percurso. Estava tudo acabado! Ribanceira abaixo, parei. Tonta, cega, trêmula, nervosa, com medo do escuro, mas sem nenhum receio de ir em frente.

Sim. Capotei todos os dias. Mas, diferente daquele carro, eu estava sozinha, e até gritei. Ninguém ouviu.

Agora passou. Sem dores no corpo, com as últimas marcas desaparecendo, me preparo pra outra viagem. Tem outro dia vindo por aí.

Vaga lembrança


O amor passou por aqui.
Foi tão rápido e devastador, que alguns nem acreditam.
Eu sei que passou. Porque não sou mais a mesma.
O amor arrancou minhas roupas e minha paz
me tirou do rumo, me levou de casa, me largou na rua.
O amor calou meu Carnaval e ofuscou minha folia
rabiscou meus papéis e secou meus tinteiros.
O amor me mostrou o poder da verdade e a dor da mentira
me pôs em pecado, enfraqueceu minhas orações, fortaleceu minha fé.
O amor despenteou os meus cabelos, suou meu corpo

e estremeceu minhas pernas, depois, me despertou com um sorriso,
sambou no meu juízo, cantou pra eu dormir e,
enquanto sonhava, ele fugiu, covarde,

sem sequer dizer adeus.