Sou apaixonada por nossa história política. Prestar atenção aos movimentos e pessoas que fazem a diferença no país - seja para o bem ou o mal - não foi imposto pelo meu trabalho, é algo que faço desde criança.
A primeira recordação política vem dos seis anos. Acompanhava cada edição do Jornal Nacional só para saber se Tancredo Neves havia melhorado. Lembro que não entendia quase nada da matéria e perguntava depois a minha avó. “Ele já tá bom?” “Ainda não...”. Então, voltava às bonecas enquanto esperava as próximas notícias.
Na noite derradeira, a cobertura da Globo não meu deixou com dúvidas. Quando a notícia foi ao ar minha, mãe fez uma cara triste, pegou a carteira de cigarros e foi para o jardim sem dizer uma palavra. Eu segui os seus passos, parei no terraço, sentei no chão, agarrei uma bola que estava por perto e chorei. Não sabia o porquê da dor e até me envergonhei um pouco dela, mas sabia que aquilo era sim um motivo para chorar. “O que foi, menina? Tá chorando por que?” “Porque Tancredo morreu. E agora?”.
Agora viria Sarney, o cara que adorava aumentar o salário da minha avó, uma servidora pública federal. Ela dizia que esse era o melhor presidente que o Brasil já teve, mas eu não gostava dele. O salário até aumentava, mas nunca dava para pagar as contas. O atraso no pagamento da mensalidade da escola era tão religioso quanto às idas de toda a família ao mercado para garantir o maior número possível de latas de leite e pedaços de carne. Eu detestava fazer feira duas vezes por semana e detestava o Sarney, aquele feioso de bigode esquisito.
Só não era mais esquisito que o Collor, que acabou com os meus sonhos de eleger Lula presidente. Tá, eu ainda não podia voltar aos 11 anos, mas se pudesse, seria em Lula. E mais uma vez está na política uma das minhas mais nítidas lembranças de infância, quando corria pela praia do Pina sacudindo uma bandeira branca com letras vermelhas, onde estava escrito: Lula 13, e cantando o hino do momento. “Lula lá, brilha uma estrela!”.
Mais uma vez, sem a menor explicação, um homem público me emocionava e me recarregava de esperanças. Não é a toa que foi por ele meu segundo choro político, no dia em que a mesma Globo comunicou que ele era o novo presidente da República. Demorou anos para isso acontecer, mas lembro de cada detalhe dos governos que o antecederam. Especialmente da farra que foi ir às ruas (escondida da minha avó, é claro), comemorar o impeachment de Collor.
Mas apesar de ser apaixonada por toda essa onda política, nunca senti necessidade de me filiar a um partido, amarrar minha crença a uma só instituição. Aprendi com o tempo - e com a própria política - a buscar a verdade nas pessoas, avaliar cada pequeno ato, confiar no mais sério, independente de legenda. Minhas manifestações públicas se resumem ao momento cara-pintada, uma caminhada de apoio a Lula na Avenida Conde da Boa Vista e várias comemorações da vitória vermelha no Marco Zero.
Chego aos 30 anos com a tranqüilidade de ter dado votos conscientes, de estar cumprindo direitinho meu papel de cidadã. Não é porque um lote de políticos sai por aí se aproveitando do dinheiro público e se envolvendo em negócios ilícitos que vou desistir de participar do processo. Quanto mais sujeira aparece, mais eu acho indispensável que pessoas do bem se alfabetizem politicamente. Porque se quem se emociona e acredita no Brasil desistir dele, aí sim, estaremos perdidos.